domingo, 14 de fevereiro de 2016

Rotina de negação: todos os esquerdistas são o mesmo

 Ceticismo Político

Rotina de negação: todos os esquerdistas são o mesmo

by lucianohenrique
__esquerdistas
Seguramente você já ouviu essa conversa em vários lugares, dizendo que "todos os esquerdistas são iguais".
Antes de tudo é bom dizer que esta é uma estratégia retórica que visa atacar todo um grupo para vender uma espécie de purismo de outro lado. Basta relembrarmos o histórico do neoateísmo, quando Sam Harris e Richard Dawkins buscavam convencer que "todos os religiosos davam no mesmo, independentemente se fossem jihadistas ou cristãos". O objetivo era um só: vender a ideia de que apenas o ateismo militante "salvava". (Mas na verdade há uma diferença ética entre o jihadismo e o cristianismo, e vemos isso explicitamente em casos de atentados terroristas e estupros em série cometidos por pessoas pertencentes apenas ao primeiro grupo, não ao segundo)
No Brasil, os objetivos por trás desse discurso é vender alternativas como:
  1. Apoiar uma intervenção militar
  2. Apoiar uma revolução civil (algo que muitos deles talvez nem acreditem, mas vá lá)
  3. Apoiar a candidatura de Bolsonaro para 2018
O objetivo aqui não é julgar essas opções, mas a retórica utilizada para definir "todos os esquerdistas como se fossem a mesma coisa". Tudo isso facilitaria a venda de uma das três opções acima.
Se julgarmos as coisas pela ótica unicamente pragmática e indiferente a filtros morais, não podemos classificá-los como completamente errados. Embora estejam propagando uma mentira, ela atenderia a objetivos de propaganda. Pelo pragmatismo puro, eles provavelmente teriam uma justificativa.
Mas até mesmo pelo pragmatismo puro, eles deveriam ser contestados, pois no máximo falaríamos de pragmatismo aplicado ao purismo, o que é no mínimo bizarro. Imaginemos a terceira opção - eleição de Bolsonaro em 2018 - que provavelmente será cada vez mais dificultada pelas leis já implementadas (e outras novas leis que o PT deve determinar) pela extrema-esquerda. Mas para combater essas leis da extrema-esquerda, ele dependeria da ajuda de deputados da esquerda moderada. Todavia, ele se recusa ao diálogo de pressão com estes deputados, pois para ele "não há diálogo com nenhum esquerdista, nem centrista" e, em casos mais extremos, "nem mesmo com qualquer liberal". Digamos que isso é se imaginar em ação pragmática, mas agir, de fato, pelo purismo. Mesmo assim, se eles se sentem contentes ao agir dessa forma, podemos entender o modelo mental para essas escolhas. O que importa aqui é saber: o lançamento de todos os esquerdistas em um único saco é ao menos idealizado em torno de um objetivo.
O problema moral é radicalmente mais grave e perturbador, e pode ser visualizado ao relembrarmos a belíssima fala de Janaína Paschoal ao programa Roda Viva, em setembro de 2015:
É muito evidente que esses 2 minutos e meio acima explicam muita coisa. Mesmo que PMDB e PSDB sejam partidos de esquerda, eles não são de extrema-esquerda, e aí há uma diferença moral radical: enquanto o PT é dedicado a implantar um totalitarismo, o mesmo não pode ser dito de PMDB e PSDB. Podemos, é claro, criticar suas defesas do estatismo, da agenda do marxismo cultural e até varias alianças feitas, mas não podemos praticar equivalência moral.
Mas se o purista de direita diz que "todos são a mesma coisa", então subcomunica para a plateia que o totalitarismo do PT, do PCdoB e do PSOL não faz diferença, pois "se todos os esquerdistas são iguais", logo estas ações totalitárias não seriam problema suficiente para diferenciar estes últimos.
Os puristas podem até se defender dizendo: "na verdade, o que estou dizendo é que lá no fim o esquerdismo moderado do PSDB e do PMDB vão resultar no totalitarismo do PT", mas essa mesma desculpa pode ser utilizada por todos contra todos. Veja:
  • Um liberal pode dizer que a aceitação, por parte dos conservadores, que o estado interfira em questões de costumes pode levar ao estatismo, até mesmo o de extrema-esquerda
  • Um conservador pode dizer que a tendência liberal a aceitar a liberdade quanto aos costumes irá transferir para o estado a questão dos valores morais e isso vai resultar no socialismo (é algo mais ou menos nessa linha que alguns conservadores costumam dizer)
  • Um direitista purista em geral pode dizer que o esquerdismo moderado de alguns partidos vai levar ao totalitarismo da extrema-esquerda
Em todos os casos, o padrão é o mesmo, mas faltam evidências. O que deveria importar, nesses casos, é a busca por evidências táticas, mas isso quase nunca é discutido. Nota-se que, na busca por mais mitos políticos, o realismo em análises políticas é mandado para o espaço. De novo vale lembrar que isso não surpreende muito se considerarmos o baixo nível do debate tático político brasileiro atual praticado pela oposição, mas aqui o problema vai além: na tentativa de "empacotar" vários oponentes no mesmo saco, esses direitistas true terminam no fim fazendo uma propaganda perigosíssima: o totalitarismo de PT, PCdoB e PSOL não é tão importante assim, e, por isso "PMDB e PSDB" são iguais a eles mesmo e não tem conversa!
A mensagem subcomunicada é terrível e "relaxa" as mentes para lutar contra aquilo que é efetivamente mais perigoso na extrema-esquerda: a implementação de uma ditadura. É que isso deixa de ser importante para esses direitistas, pois, quando o cérebro "iguala todas as opções", as diferenças mais perigosas de um dos lados passam a se tornar menos perceptíveis. Talvez aí esteja uma das chaves para descobrir porque somos tão incapazes de nos proteger do totalitarismo.
Na verdade, há uma diferença moral enorme - como bem lembrou Janaína Paschoal - entre partidos de esquerda moderada e de extrema-esquerda. Não notar essa diferença é perigosíssimo. Pode até ser interessante levar as discussões com esses confusionistas para a esfera do debate moral, questionando-os: "Realmente você não vê diferença moral entre implementar ditaduras e não implementar?". Esse tipo de questionamento já é suficiente para começar a sessão de desmascaramento.
Vale lembrar que renegar o frame "todos os esquerdistas são exatamente iguais" não implica abandonar opções de direita. Na verdade, o ideal é lutar pelo crescimento do pensamento de direita até termos opções viáveis de candidatos ao poder executivo que sejam de direita. Enquanto isso, nada impede de votarmos em candidatos centristas e esquerdistas moderados se isso for útil para tirar a extrema-esquerda do poder. Isso sim seria o real pragmatismo, tanto em prática como em pensamento.
lucianohenrique | 14 de fevereiro de 2016 às 5:15 pm | Tags: bolivarianismoextrema-esquerda,guerra políticajogos políticosmarxismopetralhasPTsocialismo | Categorias: Uncategorized | URL: http://wp.me/pUgsw-bzz

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