Brasil não controla corrupção de suas empresas no exterior, diz ativista
João Fellet
Enviado especial da BBC Brasil à Angola
Atualizado em 18 de setembro, 2012 - 06:27 (Brasília) 09:27 GMT
Além de violar convenções internacionais contra a corrupção, o governo brasileiro se vale de manobras ilegais para conceder empréstimos a companhias brasileiras que operam fora do país, diz Cláudio Abramo, diretor da ONG Transparência Brasil.
"Não existe qualquer mecanismo de controle para atos de corrupção de empresas brasileiras no exterior", ele afirma à BBC Brasil.
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"Hoje, uma empresa brasileira vai a um país, suborna um ministro e adquire um contrato sem qualquer licitação. De posse do contrato, vai ao BNDES (Banco Nacional para o Desenvolvimento Econômico e Social) e consegue um financiamento para a execução desse serviço."
O Brasil é um dos 39 signatários da Convenção Anti-Propina da Organização para a Cooperação Econômica e Desenvolvimento (OCDE), de 1997. Ao subscrever o documento, o país se comprometeu a combater propinas pagas por suas empresas no exterior.
No entanto, segundo a ONG Transparency International (sem relações com a Transparência Brasil), o país não tem cumprido a convenção.
Em relatório divulgado no início do mês, o órgão avaliou a aplicação da convenção por cada um de seus signatários. Os países foram divididos em quatro categorias, conforme o grau de adoção de medidas contra propinas.
O Brasil ficou na penúltima categoria, entre os países que fazem "pouca aplicação" da convenção. No topo da lista, EUA, Alemanha, Itália e Grã-Bretanha integram o grupo que faz "aplicação ativa" das medidas.
Falhas
Abramo diz que o BNDES, maior financiador de empresas nacionais no exterior, deveria exigir que todos os seus empréstimos externos fossem regidos pela lei brasileira de licitações.
Ele cita como exemplo os procedimentos adotados pelo BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento) e pelo Banco Mundial em seus empréstimos – ambos condicionam os financiamentos ao cumprimento de suas próprias regras, e não à legislação dos países beneficiados.
Abramo diz ter defendido o modelo em reuniões com a direção do BNDES. O banco, no entanto, teria rejeitado a sugestão.
O diretor da Transparência Brasil considera haver outras falhas nos financiamentos dos bancos públicos nacionais a empresas brasileiras no exterior.
Pelo sistema, os bancos fazem os repasses às empresas em reais, no Brasil, mas as dívidas são quitadas pelos governos dos países onde as obras são realizadas. Ou seja, por meio de uma triangulação, os financiamentos têm esses governos como partes.
Para Abramo, a prática é fraudulenta, uma vez que os bancos nacionais não poderiam participar de operações com Estados estrangeiros.
"A situação é no mínimo irregular, porque esses bancos não são agências bilaterais."
O diretor da Transparência Brasil questiona ainda o conceito de "exportação de serviços", categoria em que os bancos enquadram a maioria dos repasses feitos às empresas brasileiras no exterior.
"É um conceito frágil, porque quando uma empreiteira brasileira faz um serviço no exterior, contrata localmente a mão de obra e usa equipamentos fabricados em outros países."
Legalidade
Em nota à BBC Brasil, o BNDES diz que as operações realizadas pelo banco no exterior ocorrem "dentro da mais absoluta legalidade" e são amparadas pelo 9º artigo de seu estatuto.
O artigo prevê que o banco contrate "operações, no Brasil ou no exterior, com entidades estrangeiras ou internacionais" e que financie "a exportação de produtos e de serviços, inclusive serviços de instalação, compreendidas as despesas realizadas no exterior, associadas à exportação".
De acordo com o banco, o objetivo dos financiamentos é incentivar a criação de postos de trabalho, renda e de divisas no Brasil.
A Odebrecht emprega aproximadamente 1.400 funcionários brasileiros e 18,6 mil angolanos em suas operações em Angola. As empreiteiras brasileiras, ao contrário das chinesas, por exemplo, costumam dizer que contratam grande porcentual de mão de obra local nos países em que atuam.
O banco diz ainda que os financiamentos são liberados conforme a execução dos serviços.
"Cada liberação do BNDES é obrigatoriamente precedida de dois relatórios de auditoria (um do exportador e outro do importador), comprovando a efetiva prestação do serviço e as exportações brasileiras. Ambas as auditorias são exigências contratuais do BNDES."
De acordo com o banco, as aprovações de crédito são analisadas individualmente e atendem às prioridades dos governos estrangeiros. O banco diz que os empréstimos são garantidos pelo Tesouro Nacional.
"O cuidado com que essas operações são realizadas pode ser mensurado pelo baixo índice de inadimplência, que é praticamente zero."
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